INDULGENTIARUM DOCTRINA

 


PAPA PAULO VI


RESUMO DA CONSTITUIÇÃO APOSTÓLICA INDULGENTIARUM DOCTRINA

SOBRE A DOUTRINA DAS INDULGÊNCIAS


I


Assim nos ensina a revelação divina que os pecados acarretam como consequências penas infligidas pela santidade e pela justiça divina, penas que devem ser pagas ou neste mundo, mediante os sofrimentos, dificuldades e tristezas desta vida e sobretudo mediante a morte, ou então no século futuro pelo fogo, pelos tormentos ou penas purgatórias.

Podem restar e de fato restam frequentemente penas a expiar ou sequelas de pecados a purificar, mesmo depois de remida a falta; a doutrina relativa ao purgatório mui bem o mostra: nesse lugar, com efeito, as almas dos defuntos que “verdadeiramente penitentes deixaram esta vida na caridade de Deus, antes de terem satisfeito suas ofensas e omissões por justos frutos de penitência”, são após a morte purificadas pelas penas purgatórias.


II


Por insondável e gratuito mistério da divina disposição, acham-se os homens unidos entre si por uma relação sobrenatural. Esta faz com que o pecado de um prejudique também os outros, assim como a santidade de um traga benefícios aos outros. Assim se prestam os fiéis socorros mútuos para atingirem seu fim eterno. O testemunho dessa união é evidente no próprio Adão, pois seu pecado passa a todos os homens por propagação hereditária. Mas o mais alto e mais perfeito princípio, o fundamento e o modelo dessa relação sobrenatural, é o próprio Cristo, no qual Deus nos chamou a ser inseridos.


III


Consciente dessas verdades, desde o princípio a Igreja conheceu e praticou vários modos de agir para que os frutos da redenção do Senhor fossem aplicados a cada fiel e cooperassem os fiéis na salvação de seus irmãos, e assim todo o corpo da Igreja fosse preparado na justiça e na santidade para o pleno advento do Reino de Deus, quando Deus há de ser tudo em todos.


IV


A convicção existente na Igreja de que os Pastores do rebanho do Senhor podem por meio da aplicação dos méritos de Cristo e dos Santos libertar cada fiel dos restos de seus pecados introduziu aos poucos no correr dos séculos, pelo sopro do Espírito Santo que sempre anima o Povo de Deus, o uso das indulgências; uso pelo qual se efetuou um progresso, não uma mudança, na doutrina e na disciplina da Igreja, e da raiz que é a revelação brotou um novo bem para a utilidade dos fiéis e de toda a Igreja.

Pouco a pouco se propagou o uso das indulgências e se tornou um fato notório na história da Igreja desde que os Pontífices Romanos decretaram que certas obras favoráveis ao bem geral da Igreja “poderiam ser imputadas ao título de uma penitência total”.

Essa remissão da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à falta foi chamada propriamente “indulgência”. Nisso a indulgência apresenta traços comuns com os outros modos ou meios destinados a apagar as consequências dos pecados, mas deles também se distingue claramente.

O fim intencionado pela autoridade eclesiástica na concessão das indulgências é não apenas ajudar os fiéis a pagarem as penas que devem, mais ainda incitá-los ao exercício das obras de piedade, de penitência e de caridade e, particularmente, das obras que conduzem ao progresso da fé e ao bem geral.

Se os fiéis transferem as indulgências a favor dos defuntos, exercem então de maneira excelente a caridade e, elevando seu pensamento para as realidades celestes, tratam as coisas terrestres do modo mais correto.

Ainda hoje convida a Igreja todos os seus filhos a considerarem e a meditarem na vantagem que pode oferecer o uso das indulgências, para favorecer a vida de cada um deles bem como a de toda a comunidade cristã. Para brevemente relembrar os principais benefícios, a usança salutar das indulgências ensina “como é triste e amargo ter abandonado o Senhor Deus”. Pois os fiéis, quando se empenham em ganhar as indulgências, compreendem que por suas próprias forças não podem expiar o prejuízo que se infligiram a si mesmos e a toda a comunidade, e por isso são excitados a uma salutar humildade.

Embora sejam as indulgências benefícios gratuitos, não são concedidas tanto a favor dos vivos como dos defuntos a não ser que se cumpram as condições requeridas para sua obtenção. Duma parte devem ser cumpridas as boas obras prescritas, doutra parte deve o fiel apresentar as disposições exigidas, isto é, que ame a Deus, deteste os pecados, tenha confiança nos méritos de Cristo e firmemente creia na grande utilidade que para ele mesmo representa a comunhão dos Santos.


V


As normas seguintes trazem à disciplina das indulgências as mudanças oportunas, não sem ter recolhido as propostas das Conferências Episcopais.

As ordenações do Código de Direito Canônico e dos Decretos da Santa Sé relativas às indulgências que coincidirem com as novas normas ficam inalteradas.


NORMAS


N. 1. Indulgência é a remissão, diante de Deus, da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel, devidamente disposto e em certas e determinadas condições, alcança por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e aplica, com autoridade, o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos.

N. 2. A indulgência é parcial ou plenária, conforme libera parcial ou totalmente da pena devida pelos pecados.

N. 3. As indulgências, ou parciais ou plenárias, podem sempre aplicar-se aos defuntos por modo de sufrágio.

N. 4. Doravante indicar-se-á a indulgência parcial apenas por estas palavras: “indulgência parcial”, sem determinação alguma de dias e anos.

N. 5. Ao fiel que, ao menos contrito de coração, realiza uma obra enriquecida duma indulgência parcial, é concedida pela Igreja uma remissão de pena temporal igual à que ele mesmo obtém por sua ação.

N. 6. A indulgência plenária só pode ser adquirida uma vez por dia, ressalvada a prescrição da norma 18 para os que se acham “in articulo mortis”. Mas pode adquirir-se a indulgência parcial várias vezes no mesmo dia, a menos que expressamente seja indicada outra disposição.

N. 7. Para adquirir a indulgência plenária é preciso fazer uma obra enriquecida de indulgência e preencher as seguintes três condições: confissão sacramental, comunhão eucarística e oração nas intenções do Sumo Pontífice. Requer-se além disso rejeitar todo o apego ao pecado, qualquer que seja, mesmo venial. Se falta essa plena disposição ou não se cumprem as supramencionadas condições, ficando intacta a prescrição da norma 11 para os que se acham “impedidos”, a indulgência será apenas parcial.

N. 8. As três condições podem ser preenchidas em dias diversos, antes ou após a realização da obra prescrita; mas convém que a comunhão e a oração nas intenções do Soberano Pontífice se façam no mesmo dia em que se faz a obra.

N. 9. Com uma só confissão sacramental, podem adquirir-se várias indulgências plenárias, mas para cada indulgência plenária é necessária uma comunhão e as orações nas intenções do Sumo Pontífice.

N. 10. A condição da oração nas intenções do Sumo Pontífice pode ser plenamente cumprida recitando em suas intenções um Pai-nosso e Ave-Maria; mas é facultado a todos os fiéis recitarem qualquer outra oração conforme sua piedade e devoção para com o Pontífice Romano.

N. 11. Sem prejuízo da faculdade dada aos confessores pelo cân. 935 do CDC de comutarem para aqueles “que se acham impedidos” ou a obra prescrita ou as condições requeridas, podem os ordinários locais conceder aos fiéis sob sua autoridade, conforme as normas do direito, caso morem esses fiéis em lugares onde lhes é impossível ou ao menos muito difícil confessar-se ou comungar, a possibilidade de ganharem a indulgência plenária sem confissão e comunhão imediata, contanto que tenham o coração contrito e estejam dispostos a se aproximarem desses sacramentos logo que o puderem.

N. 12. Fica abolida a distinção das indulgências em pessoais, reais e locais, para fazer aparecer mais claramente que são as ações dos fiéis as enriquecidas com indulgências, mesmo que às vezes ligadas a um objeto ou a um lugar.

N. 13. O Manual das Indulgências será revisto a fim de que não sejam enriquecidas de indulgências senão as principais orações e obras de piedade, de caridade e de penitência.

N. 14. Os catálogos e compilações de indulgências das ordens, congregações religiosas, sociedades de vida comum sem votos, institutos seculares e associações pias de fiéis serão revistos assim que possível, para a indulgência plenária poder ser adquirida só em certos dias particulares, marcados pela Santa Sé, sob proposta do superior-geral ou, em se tratando de associações pias, do ordinário do lugar.

N. 15. Em todas as igrejas, oratórios públicos ou semipúblicos ― para os que legitimamente usam desses últimos ― pode-se ganhar a indulgência de 2 de novembro, que só pode ser aplicada aos defuntos. Além disso nas igrejas paroquiais pode-se ganhar a indulgência plenária em duas ocasiões por ano: na festa do titular e no dia 2 de agosto, dia da indulgência da “Porciúncula” ou noutro dia mais oportuno que o ordinário fixará. Todas as supramencionadas indulgências podem ganhar-se nos referidos dias ou, com o consentimento do ordinário, no domingo precedente ou no domingo seguinte. As outras indulgências, ligadas a igrejas ou oratórios, serão o mais cedo possível revistas.

N. 16. A obra prescrita para ganhar a indulgência plenária ligada a uma igreja ou oratório é a visita piedosa durante a qual se recitará a oração dominical e o símbolo da fé (Pai-nosso e Creio).

N. 17. Aos fiéis que utilizam religiosamente um objeto de piedade (crucifixo, cruz, terço, escapulário, medalha), validamente abençoado por um padre, concede-se indulgência parcial. Ademais, se o objeto de piedade foi bento pelo Soberano Pontífice ou por um bispo, os fiéis que religiosamente o usam podem também obter a indulgência plenária no dia da festa dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, ajuntando, porém, a profissão de fé sob uma forma legítima.

N. 18. No caso da impossibilidade de haver um padre para administrar a um fiel em perigo de morte os sacramentos e a bênção apostólica com a indulgência plenária a ela ligada, de que se trata no cân. 468, parágrafo 2, do CDC, concede benignamente nossa piedosa Mãe Igreja a esse fiel bem-disposto a indulgência plenária a lucrar em artigo de morte, com a condição de ter ele durante a vida habitualmente recitado algumas orações. Para aquisição dessa indulgência é louvável empregar um crucifixo ou uma cruz. Essa mesma indulgência plenária em artigo de morte pode ser ganha por um fiel, ainda que ele já tenha no mesmo dia ganho outra indulgência plenária.

N. 19. As normas estabelecidas quanto às indulgências plenárias, especialmente a norma 6, são aplicáveis às indulgências plenárias que até então se chamavam toties quoties.

N. 20. Nossa piedosa Mãe Igreja, em sumo grau solicita pelos fiéis defuntos, resolveu conceder-lhes os seus sufrágios na mais ampla medida em cada sacrifício da missa, ab-rogando por outro lado todo privilégio neste domínio.